quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Between Sun and Moon

        De uma coisa você pode ter certeza: por mais planos que você faça para seu futuro, realizará seus sonhos, mas nunca da forma esperada. É como na matemática. Tomando-se dois pontos, há infinitos meios de uni-los. Você pode desenhar uma linha reta e pode ter certeza que é o caminho mais indicado a se seguir e, apesar disso, surgirão parábolas loucas e desviá-lo da rota. Mas, o mais importante, a verdade, você chegará lá.
        Início dramático para uma crônica dramática, devo dizer. A semana que ainda está por terminar lembrava um filme de ação às avessas. Ou talvez a obra de arte do terror, Uma Noite Alucinante. Esta semana tinha tudo para ser um desastre, mas foi o paraíso.
        Como todos sabem, Vinícius e eu fizemos parte de uma banda interessante no início de nossas carreiras musicais, ele baixista e eu guitarrista. Como toda banda há de acabar um dia, não vou me alongar entrando nos méritos dessa discussão agora. Não vale a pena e nem quero lembrá-la. Talvez escreva um roteiro de novela e mandarei rodá-la no México, de preferência. Nos dois anos em que a banda existiu, pouco se fez, muito se planejou. Havia um desleixo gritante por parte dos outros dois integrantes nos impedindo de evoluir, o que nos levou a um tempo de vacas magras, tendo tocado em apenas quatro ocasiões, e nos separamos amargamente.
Três longos anos se passaram desde o divórcio forçado e comemorado, e tendo escrito uma penca de canções desde 2005, surgiu a oportunidade de ouro: O Festival de Música de Além Paraíba. Quando soubemos da realização do tal festival, fomos às nuvens. Era o que ansiávamos há tempos, parecia um sonho. Que se tornou um pesadelo. E que voltou a ser um sonho.
        Extasiados, formamos um plano: Vinicius no baixo e vocal e Arthur, que é irmão do digníssimo baixista, e eu nos violões, uma apresentação acústica. A música escolhida (vão ao festival e ficarão sabendo qual é) era fantástica, uma verdadeira bomba, e no esquema que escolhemos fazer, iria ficar maravilhosa. Eu morando em Juiz de Fora e os outros dois em Leopoldina (eu curso Estatística na UFJF e eles Engenharia de Controle e Automação no CEFET, ou seja, um bando de nerd das Ciências Exatas) tomaríamos as férias para ensaios. Na verdade, tomamos uma semana das férias para ensaios. E acreditávamos que seria o suficiente. Durante essa semana, fui convidado a me hospedar na casa de meu querido amigo e fiquei muito feliz com isso, pois lá é um lugar que me está no coração, bem como seus familiares a quem respeito e admiro.
        Mas, as rosas desapareceram. Vinicius decidiu abandonar o microfone. Como encontrar um novo vocalista em apenas 7 dias? Sorte, meus amigos. Quando Arthur estudava em um cursinho Além Paraibano, fez aulas de Matemática com um rapaz que já havia cantado muito por aí. Parecia a solução ideal. E era mesmo. Além de cantar bem, ele tem uma ótima presença e nos trouxe um baterista a tiracolo. Ele só nos deixou com a pulga atrás da orelha ao chegar alguns minutos atrasado, o que nos fez ter uma lembrança sombria do nosso antigo amigo vocalista.
        Passado o susto, o ensaio foi ótimo, apesar da timidez que expelíamos. Nesse dia tivemos a presença sublime de um outro amigo nosso, Rafael, que, após os ensaios, ele, Arthur e eu tocamos muitas pérolas da música nacional. E após os ensaios tivemos conversas contundentes a respeito do rumo que o ensaio tomou. Primeiramente ficamos entusiasmados por ter de volta uma bateria na banda. Pode ser bonito e tudo, mas acústico, só com cordas, cansa. E a bateria dá uma nova vida às músicas, deixando-as mais imponentes. Passado o entusiasmo, nos vimos em um dilema épico: nos falta tempo para ensaiar direitinho com a bateria. Tristes abatidos, resolvemos deixar a música como estava, só violões e baixo mesmo e o sonho da bateria ficaria para a próxima. Fomos dormir desapontados. Acordamos no outro dia e decidimos zerar Jurassic Park, um jogo fodão do Super Nintendo. Jogamos um dia inteiro. E não zeramos.
        Chegamos à quarta-feira, Leitores. Dia da minha partida para Sapucaia e, de lá, para Juiz de Fora. Depois de uma estadia magnífica e momentos sublimes, era hora de partir. Mas antes, haveria um último ensaio para repassar as mudanças e logo em seguida fazermos nossa inscrição no Festival. Mas havia uma fogueira acesa e, no último momento, remarcamos o ensaio com a bateria. Ficou marcado para as 19h, e eu pretendia que o ensaio acabasse até as 21:30h para que eu pudesse pegar o ônibus das 22h para Sapucaia. Mas adiantarei que só peguei o ônibus das 7:30 da manhã seguinte.
        Vou começar a agora a parte épica da nossa aventura. Ligamos mais cedo para Felipe, para marcarmos um papo. Até a hora dele chegar minha bateria, que faz o violão funcionar ligado, acabou. Chique que nós somos compramos por telefone uma nova a mandamos trazê-la via motoboy. Felipe chegou, e com ele, Rafa, sua digníssima amiga, de muito boa alma, e que teve paciência com a gente. E nessa hora, ficou “reacertada” a entrada da bateria na canção ganhadora do Festival. E nisso era 18:02h, quando ele se foi, levando nossos amplificadores e dizendo que estaria às 19h em ponto nos esperando na ponte de Jamapará para nos levar à casa de Alexandre, até então, nosso desconhecido baterista. Chegamos a ponte por volta das 19:05h, Artur, Vinicius e eu com nossos instrumentos, nos enfurnamos no banco de trás do Palio de Felipe e partimos para a glória.
        Chegamos a uma casa suntuosa. Eu fiquei impressionado, era uma casa realmente bonita e grande. Paramos o carro na subida da garagem e Felipe tocou a campainha, pois era o único conhecido ali. Descarregamos tudo, um peso dos infernos e entramos na casa. Lá havia um cão que se apaixonou pelo Vinicius, mas essa história de amor fica para outro dia. Depois de já termos entrado, veio o dono da casa dizendo que Alexandre não morava mais lá. Legal, né? Lá moravam os pais dele. Bom, acho que ele realmente morou lá, mas havia se mudado para mais para frente, em uma casa amarela Agradecemos a educação e hospitalidade com que nos receberam e carregamos o equipamento de volta para o carro. Nisso,já são 19:19h. A gente não contava que poderia a situação piorar, mas, ao sair da descida da garagem de ré, o carro agarra em um buraco incrível. Pronto, acabou o ensaio de hoje. Vamos chamar o guincho, polícia, bombeiros tudo para tirar o carro da cratera em que se enfiou. Isso foi o que eu pensei. Graças a Deus meus amigos são calmos. E o buraco nem era tão digno dos adjetivos que lhe atribuí. Descemos todos do carro para não pesar muito, e Vinicius decidiu calçar as rodas do carro com pedras para que fizesse uma rampa e, assim sair do maldito rombo no chão. O pára-choque ficou um pouco danificado e 19:32h estávamos indo para o ensaio de verdade agora.
        Achamos a casa de Alexandre, depois de uma pequena busca. Ele havia dito por telefone enquanto estávamos na casa de seus pais, que deixaria as janelas abertas para podermos identificar seu lar. E mesmo assim não conseguimos. Demos a volta, e agora encontramos. Fomos recebidos por mais dois cachorrinhos latindo e subimos uma escada até um salão enorme. Fiquei boquiaberto com o esquema preparado lá. Parecia um estúdio de verdade. Haviam três pedestais de microfones esperando por nós e uma quantidade de aplificadores absurda. E no centro de tudo, como se as outras coisas convergissem para ela, a bateria dourada. Ela ainda estava sem os pratos, mas era linda. E seu dono se fez conhecer. Alexandre é realmente um cara gente boa. Tranquilo e centrado, demonstrou segurança e habilidade além do comum enquanto montávamos o novo arranjo para a canção. Havia lá também um amigo dele e de Felipe, o Werley. O cara é fera. Ajudou a gente a bolar coisas para o arranjo e deu idéias muito legais. Virou nosso produtor e estava tão empolgado quanto nós, loucos para saber onde aquilo tudo ia dar. Sentamos para tocar e já tínhamos passado a música umas 10 mil vezes até às 20:30h e havia muito pela frente. Eu estava quieto, pois uma dor de cabeça me pegou pelo caminho, pouco depois de chegarmos à ponte e entrarmos no carro do Felipe e não estava me sentindo bem. Mantive as pontas e segurando a dor, conseguimos levar o ensaio até o final apoteótico, com solos de baixo, meu violão distorcido no seu próprio solo e tudo. Só a última corda, a “mizinha” estava com problemas de captação, mas já levei o violão para o mecânico, e hoje o reaverei, que me custou 48 reais de mão-de-obra. Espero que volte bom mesmo! Marcamos um outro ensaio para uma semana depois, que se completa amanhã e estou empolgado mais uma vez.
        Terminado o ensaio fomos para casa. Felipe, gentilmente, nos cedeu uma carona até a casa do Vinicius. Porém, ao fazer a última curva antes de chegar ao nosso destino, pensei por um segundo que o nosso destino é que havia chegado até nós. Felipe entrou rápido na curva e um carro vinha em sentido contrário, também em alta velocidade. Por alguns centímetros não houve uma colisão fatal, pois Felipe puxou o carro para a direita e sentimos um solavanco e o carro sendo levantado pelas rodas do lado direito. Subimos na calçada e ainda por cima quase acertamos um poste. Como havia dito Felipe após a nossa quase-passagem-para-o-lado-de-lá, radical! Não poderia terminar melhor a nossa noite, onde quase tudo o que planejamos saiu ao contrário, mas sempre para melhor.